Última alteração: 2023-10-19
Resumo
Contribuição para a sociedade: O estresse por calor impacta negativamente o desempenho produtivo de vacas leiteiras. O objetivo foi avaliar o efeito da suplementação com óleo de linhaça no desempenho produtivo de vacas em pastejo na primavera e no verão. As vacas foram separadas em dois tratamentos: controle (TC) e suplementação com óleo de linhaça (TL). O grupo TL foi suplementado com 400 g/dia com óleo de linhaça. A produção de leite aumentou 1,5 L/dia no verão no grupo TL. Os teores de gordura, proteína e caseína no leite foram maiores no grupo TC. A estabilidade do leite aumentou 2,2% em vacas suplementadas com óleo de linhaça. Os resultados do presente estudo mostram que o óleo de linhaça pode ser suplementado para reduzir os efeitos negativos do estresse térmico em vacas em pastejo, proporcionando um aumento na produção e estabilidade do leite.
Palavras-chave: Estresse por calor, produção de leite, suplementação lipídica.
Introdução: A preocupação com o estresse por calor em animais de produção é crescente não apenas nas regiões tropicais e subtropicais, mais também em regiões de zona temperada (BERNABUCCI et al. 2010). Altas temperaturas combinadas com elevada umidade representam um grande desafio ao bem-estar animal (BAUMGARD et al. 2015). O estresse por calor induz uma grande mudança nas respostas fisiológicas, metabólicas e comportamentais das vacas leiteiras (BERNABUCCI et al. 2010). Como consequência direta, há uma diminuição na produção de leite e de sólidos, bem como alterações nos parâmetros físico-químicos do leite (KAPPES et al. 2022). Em sistemas a pasto, o desafio ao estresse por calor é ainda maior, considerando que os animais são expostos diretamente a radiação solar e a altas temperaturas.
Algumas abordagens nutricionais podem ser usadas para reduzir o impacto do estresse por calor sobre a produção de leite (BERNABUCCI et al. 2010). A suplementação lipídica é uma dessas alternativas, pois há um aumento da densidade energética da dieta (PALMQUIST e JENKINS 2017), compensando a redução da ingestão de matéria seca nesses períodos de estresse por calor, melhorando a eficiência energética das vacas para a produção de leite (BAUMAN et al. 2008). Estudos mostram que o óleo de linhaça se destaca na utilização para a nutrição de vacas leiteiras (HURTAUD et al. 2010). O objetivo deste estudo é avaliar o efeito da adição do óleo de linhaça sobre a produção, composição e parâmetros físico-químicos do leite de vacas a pasto nas estações de primavera e verão.
Material e métodos: O estudo foi conduzido no setor de bovinocultura de leite da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC–CAV). O estudo foi separado em dois experimentos: I – primavera, iniciando em setembro de 2021, e II – iniciando em fevereiro de 2022. Os dois experimentos foram quadrado latino 2 x 2, dois tratamentos e dois períodos de 22 dias, sendo 15 de adaptação e 7 de coletas. Os tratamentos foram: Controle (TC): pasto + 6 kg/dia de concentrado; e suplementação com óleo de linhaça (TL): pasto + 6 kg/dia de concertado + 400 g/dia de óleo de linhaça (OL), objetivando 6% de lipídeos na dieta.
No experimento I foram usadas 6 vacas por tratamento das raças Holandês e mestiças Holandês x Jersey, formando um grupo homogêneo para DEL (160 ± 64), peso (548 ± 50 kg), produção (24.6 ± 5.0 L/dia) e OP (2.5 ± 1.0). No experimento II foram usadas 5 vacas por tratamento, homogêneas para DEL (196 ± 49), peso (553 ± 60 kg), produção (21.7 ± 2.4 litros/dia) e OP (2.3 ± 1.4).
As vacas foram ordenhadas duas vezes ao dia. Após cada ordenha, as vacas receberam individualmente a suplementação de acordo com o respectivo tratamento. Posteriormente as vacas tinham livre acesso ao pasto, sem acesso a sombra e água para intensificar o efeito do estresse por calor. No experimento I, pasto de azevém perene (Lolium multiflorum cv. INIA TITAN® - entrada 20–25 cm, saída 10–12 cm), e milheto (Pennisetum americanum entrada 50–70 cm, saída 20–30 cm) no experimento II.
A produção de leite foi mensurada diariamente. A composição (teores de gordura, proteína, caseína, lactose e sólidos totais) e os parâmetros físico-químicos do leite (teste do álcool, acidez titulável e crioscopia) e cloretos quantitativos foram avaliados nos dias 15, 18 e 21 de cada período experimental. Os dados meteorológicos de temperatura (TA) e umidade relativa do ar (URA) foram coletados a cada 15 minutos e usados para calcular o índice de temperatura e umidade (ITU): (1.8 × TA + 32) – [(0.55 – 0.0055 × URA) × (1.8 × TA – 26)].
Os dados foram submetidos a ANOVA com medidas repetidas no tempo, utilizando o procedimento MIXED do software estatístico SAS®. Os dados foram previamente testados quanto à normalidade dos resíduos, utilizando o teste de Kolmogorov-Smirnov. As diferenças estatísticas foram definidas ao nível de 5%. O modelo estatístico incluiu os efeitos fixos dos tratamentos (TC e TL), dos experimentos (primavera e verão), dos períodos entre os experimentos (1 e 2), das interações entre as variáveis e do erro experimental.
Resultados e discussões: O THI médio na primavera e verão foi de 60,9 e 65,3, sendo considerado ausência de estresse por calor, no entanto o THI máximo no verão foi de 77,4 sendo considerado situação de alerta. Na primavera o THI máximo foi de 69,9 ainda considerado como ausência de estresse por calor (KAPPES et al. 2022). Houve interação entre tratamento e experimento para leite corrigido para energia e produção de proteína, e tendência para produção de leite e acidez titulável (Tabela 1). Vacas suplementadas com OL produziram 1,5 kg de leite/vaca/dia a mais no verão. Houve redução no teor de gordura, proteína e caseína com a suplementação de OL (P <0,01). O teor de lactose não diferiu entre os tratamentos. A acidez titulável aumentou 0,5ºD em vacas suplementadas com LO. A estabilidade do leite foi 2,2% maior para vacas do grupo TL. O teor de cloreto foi 0,01% menor para vacas suplementadas com OL.
Tabela 1. Médias dos mínimos quadrados e valores de P da análise de experimento combinado, experimento I (primavera) e II (verão) para produção e características físico-químicas do leite.
Variáveis
Análise conjunta
Exp I
Exp II
Valor de P
TC
TL
TC
TL
TC
TL
Trat.
Exp.
Trat.*Exp.2
Leite (L/dia)
20,2
20,7
23,3
22,8
17,2
18,7
0,39
<0,001
0,06
LCE(L/dia)1
21,7
21,9
24,6
23,7
18,7
20,1
0,73
<0,001
0,04
Gordura (%)
3,9
3,7
3,9
3,8
3,9
3,7
0,007
0,93
0,22
Gordura (g/dia)
781
781
891
860
672
703
0,98
<0,001
0,14
Proteína (%)
3,2
3,2
3,1
3,0
3,4
3,3
0,01
<0,001
0,17
Proteína (g/dia)
653
657
728
688
578
626
0,83
<0,001
0,01
Caseína (%)
2,7
2,6
2,7
2,5
2,7
2,6
<0,001
0,20
0,52
Lactose (%)
4,4
4,4
4,5
4,5
4,4
4,4
0,83
<0,001
0,90
Sólidos totais (%)
12,8
12,7
12,8
12,5
12.8
12,8
0,16
0,34
0,30
Acidez titulável (°D)
17,0
17,5
17,2
17,3
16,9
17,7
0,03
0,83
0,07
Teste do álcool (%)
71,7
73,9
76,6
78,1
66,9
69,6
<0,001
<0,001
0,18
Crioscopia (°C)
-0,537
-0,536
-0,536
-0,534
-0,538
-0,538
0,21
0,004
0,58
Cloretos (%)
0,09
0,08
0,09
0,08
0,09
0,09
<0,001
0,02
0,39
1Leite corrigido para energia; 2interação entre tratamento e experimento.
A maior produção de leite no verão em nosso estudo está provavelmente relacionada ao aumento do conteúdo energético da dieta (+ 400 g de óleo de linhaça). No entanto, esta maior produção de leite possa ser atribuída à melhoria da eficiência energética durante os períodos de estresse térmico (BAUMAN et al. 2008), já que não houve diferença observada durante a primavera. A redução nos teores de gordura pode estar relacionada ao aumento de CLA C18:2 t10, c12 no leite devido à suplementação com OL (BAUMAN et al. 2008). Benchaar et al. (2012) também relataram diminuição no teor de proteína do leite, com redução de 6% quando suplementado com 4% de OL. Parte da redução proteica pode ser explicada pela redução do teor de caseína em nosso estudo. O aumento na estabilidade do leite também pode estar relacionado a um menor incremento de calor durante a fermentação ruminal do OL.
Conclusão: A suplementação de 400 g/dia com OL em uma dieta a pasto parece melhorar a adaptação das vacas às condições de estresse térmico, evidenciado pelo aumento da produção e estabilidade do leite.
Palavras-chave
Referências
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BAUMGARD L.H.; KEATING A.; ROSS J.W.; RHOADS R.P. Effects of heat stress on the immune system, metabolism and nutrient partitioning: implications on reproductive success. Revista Brasileira de Reprodução Animal 39:173–183. 2015.
BENCHAAR C.; ROMERO-PÉREZ G.A.; CHOUINARD P.Y.; HASSANAT F.; EUGENE M.; PETIT H.V.; CÔRTES C. Supplementation of increasing amounts of linseed oil to dairy cows fed total mixed rations: Effects on digestion, ruminal fermentation characteristics, protozoal populations, and milk fatty acid composition. Journal of Dairy Science 95:4578–4590. 2012. https://doi.org/10.3168/jds.2012-5455
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KAPPES R.; KNOB D.A.; SCHEID A.L. BARRETA B.E.; PERAZZOLI L.; BERGAMASCHI MENDES B.; ALESSIO D.R.M.; THALER NETO A. Rumination time, activity index, and productive performance of Holstein and crossbred Holstein × jersey cows exposed to different temperature-humidity indexes. International Journal of Biometeorology 66:791–801. 2022. https://doi.org/10.1007/s00484-021-02237-3
PALMQUIST D.L.; JENKINS T.C. A 100-Year Review: Fat feeding of dairy cows. Journal of Dairy Science 100:10061–10077. 2017. https://doi.org/10.3168/jds.2017-12924