Última alteração: 2023-10-19
Resumo
Contribuição para a sociedade: A diarreia neonatal em bezerros é uma síndrome de grande importância nas cadeias leiteira e de carne, impactando no desenvolvimento do animal, sendo causada principalmente por patógenos e desencadeada por fatores como manejo e ambiência. A identificação dos agentes causadores favorece um tratamento mais eficaz reduzindo gastos, promovendo uma resposta mais rápida ao patógeno e evitando o uso inadequado de antimicrobianos. Os dados expostos neste trabalho são oriundos dos laudos dos Laboratórios de Parasitologia e Imunodiagnóstico da Universidade do Oeste de Santa Catarina - Xanxerê, referência regional para a realização dos exames. O objetivo deste trabalho é relatar a casuística de infecção e coinfecções dos principais agentes causadores da diarreia neonatal bovina ocorrida no oeste catarinense entre 2022-2023.
Palavras-chave: coronavírus bovino, rotavírus, Escherichia coli, Cryptosporidium spp.
Introdução: A diarreia neonatal bovina é uma afecção de etiologia complexa, com origens infecciosas e não-infecciosas. Dentre os principais agentes infecciosos destacam-se as causas bacterianas associadas às cepas de Escherichia coli e Clostridium perfringens; virais, envolvendo rotavírus e coronavírus; e as causas protozoárias, especialmente relacionadas a Cryptosporidium spp. As coinfecções entre estes podem exacerbar os sinais clínicos da diarreia, devido as patofisiologias de cada agente infeccioso (DELLING; DAUGSCHIES, 2022). A susceptibilidade individual dos animais está intrinsecamente relacionada à correta colostragem. Conforme à medida que ocorrem mudanças fisiológicas que fortalecem o sistema imunológico neonatal, observa-se uma significativa redução na incidência de diarreia causada por esses agentes infecciosos (PAPP et al., 2013). Portanto, se faz necessário enfatizar a importância das investigações diagnósticas tanto para a prevenção de novos casos, quanto para a redução dos custos. As manifestações clínicas da síndrome da diarreia neonatal bovina acarretam impactos econômicos consideráveis para os bovinocultores e a indústria pecuária. Este fato está principalmente interligado à diminuição no desempenho, gastos com medicamentos e diagnóstico laboratorial, bem como a necessidade de substituição de animais (SMITH, 2012). Com base nessas considerações, o estudo teve como objetivo relacionar a casuística de infecções envolvendo os principais agentes causadores de diarreia neonatal bovina, Cryptosporidium spp., Escherichia coli K99, rotavírus, coronavírus e suas possíveis coinfecções.
Material e métodos:
Um total de 180 amostras de fezes, coletadas de bezerros com diarreia, entre março de 2022 e agosto de 2023 foram utilizadas no estudo. A maioria dos animais amostrados tinha entre um até 21 dias de idade e eram provenientes de 50 propriedades do Oeste de Santa Catarina. As amostras foram coletadas por médicos veterinários de campo e enviadas aos laboratórios Parasitologia e Imunodiagnóstico da UNOESC - Xanxerê - SC. A técnica empregada para o diagnóstico de Cryptosporidium spp. foi Ziehl-Neelsen modificada, enquanto para rotavírus, coronavírus e E. coli patogênica - K99 (IDEXX), foi utilizado o teste de ELISA para a detecção de antígenos, de acordo com as instruções do fabricante.
Resultados e discussões: Dentre as 180 amostras analisadas, 43.9% foram positivas para apenas um patógeno e 9.4% das amostras foram identificadas como coinfecção com dois patógenos (figura 1). O patógeno mais frequentemente detectado foi Cryptosporidium spp, identificado em 39.4% das amostras (em 32.2% das amostras em infecções únicas e em 7.2%, em coinfecções), estando presente em 37 das 50 propriedades. O segundo patógeno mais detectado foi o rotavírus, seguido pelo coronavírus, identificados em 10.5% e 9.4% das amostras, respectivamente. A frequência de amostras positivas para E. coli foi de 3.3%. Nenhuma coinfecção de coronavírus e E. coli foi detectada. Enquanto as demais 46.7% amostras foram negativas para todos os agentes testados.
Figura 1. Frequência de animais positivos para os patógenos (Cryptosporidium spp., Coronavírus, E. coli patogênica - K99, Rotavírus) associados à diarreia neonatal bovina no oeste de Santa Catarina (2022- 2023).
Os resultados encontrados no presente estudo são similares a outros realizados no Brasil, visto que nestes as porcentagens de animais positivos para Cryptosporidium spp. variaram de 50.4% - 54.6%; e para coronavírus e rotavírus, 7.2 e 6.4%, respectivamente (CRUVINEL et al., 2020; OLIVEIRA et al., 2021). No entanto, a frequência de positivos para Cryptosporidium spp., no presente estudo, ficaram inferiores aos estudos acima citados e as frequências de rotavírus e coronavírus, um pouco superiores. A prevalência desses patógenos varia entre países, regiões, tipo de estudo realizado e testes de diagnóstico empregados. De modo geral, já foram relatadas em vários países frequências de positivos para Cryptosporidium spp., variando de 4-62,1%; para rotavírus, 10-59%; para coronavírus, 0-10%; e para E. coli enteropatogênica, de 3-41% (VAN MOL et al., 2022; CAPPELLARO et al., 2023). Além dos patógenos identificados, outros patógenos podem estar associados a esses casos de diarreia, como Salmonella spp. e Clostridium perfringens. Porém, no presente estudo esses patógenos não foram testados ou considerados. Isso pode justificar em parte a porcentagem de amostras negativas (46.7%), número esse que é similar ao encontrado em outros estudos, no Brasil e em outros países, cuja porcentagem chegou até 60% (CRUVINEL et al., 2020; VAN MOL et al., 2022). Causas não-infecciosas, como problemas nutricionais, podem também contribuir em parte com a porcentagem de animais negativos. Em vista disso, além de identificar as causas infecciosas faz-se necessário mitigar as causas não-infecciosas, que podem ser responsáveis ou agravar os quadros de diarreia, como falhas na colostragem, alta contaminação ambiental, estresse e ausência de vacinação das vacas para rotavírus, coronavírus e E. coli. A identificação dos patógenos que estão acometendo os animais, somada a redução da pressão de infecção, um correto manejo nutricional e de colostragem, vacinação das vacas e a melhora no bem-estar animal são essenciais na redução da incidência de diarreia neonatal em propriedades leiteiras. A redução da diarreia neonatal bovina, além de promover a saúde animal e reduzir gastos, também pode promover a saúde humana. Uma vez que que cepas de Cryptosporidium spp., e de rotavírus também podem acometer humanos e causar doença entérica. As pessoas podem se infectar com esses patógenos, principalmente pela ingestão de água ou alimentos contaminados (VAN MOL et al., 2022).
Conclusão: O protozoário Cryptosporidium spp. possui uma presença relevante na região, portanto devem ser desenvolvidas medidas para a redução da prevalência desse protozoário na bovinocultura do oeste catarinense. Ademais, é evidenciado a necessidade de controle da circulação de rotavírus e coronavírus das propriedades e o desenvolvimento de um estudo mais aprofundado para identificação de outras causas de diarreia, sejam elas infecciosas ou não.